lentes de ler
setembro 30, 2021
lentes de ler: etnias, nacionalidades e das taxonomias em que tr...
lentes de ler: etnias, nacionalidades e das taxonomias em que tr...: Sou da língua portuguesa, como diz o poeta, mas povoada constantemente por colonos de outros falares, o inglês, o alemão o espanhol; o fran...
dezembro 04, 2020
Ficarás…
em tudo que eu fizer
na palavra
que proferir
no gesto
que esboçar
na terra
que pisar.
Ficarás na água
no vinho que beber
na seara
no pão que hei-de comer
Ficarás no sonho
do meu ser.
Para um amigo
Ficarás…
Ficarás em tudo que eu fizer
na palavra
que proferir
no gesto
que esboçar
na terra
que pisar.
Ficarás na água
no vinho que beber
na seara
no pão que hei-de comer
Ficarás no sonho
do meu ser.
julho 24, 2020
lentes de ler: etnias, nacionalidades e das taxonomias em que tr...
lentes de ler: etnias, nacionalidades e das taxonomias em que tr...: Sou da língua portuguesa, como diz o poeta, mas povoada constantemente por colonos de outros falares, o inglês, o alemão o espanhol; o fran...
julho 23, 2020
Utopia
A questão da propriedade já intrigava More desde
criança. Contudo, ele acabaria por vir a tornar-se «relativamente rico»,
chegando a ocupar um cargo de «Tesoureiro» de Henrique VIII, o que nos leva a
crer que Thomas More teria sido um homem de opiniões controversas, no que se referia à
questão da ética da propriedade.
Em A Utopia ele explora a ideia de «propriedade», de
vários pontos de vista – a personagem Raphael Hitlodeu, português, aventureiro,
navegador, companheiro de viagem de Américo Vespúcio, considera injusta a
aplicação da pena de morte. Ele acha que esta pena não trará nenhum
«ensinamento» que leve o «ladrão» a respeitar a propriedade alheia.
Por outro lado, a pena
de morte vai contra a vontade de deus. Uma vez que, nem o ladrão aprende depois
de morto, nem qualquer outro pobre diabo, esfomeado, se inibirá de roubar.
Na realidade, nenhum usurpador
da propriedade alheia deixará de eliminar a testemunha do seu crime, já que a
punição será idêntica, quer ele a mate, quer não.
Além do mais, diz More, isso viola a vontade de deus. Deus
diz-nos – Não matarás! Contudo o ladrão – mesmo não tendo assassinado ninguém –
é punido com a pena de morte.
A distopia ou antiutopia é um conceito filosófico adoptado por
vários autores, como Robert Heinlein, Um Estranho numa Terra Estranha,
ou George Orwell, 1984 ,que retrata uma sociedade que se rege por
valores opostos aos da utopia.
A Utopia de Thomas More, além de nos dar uma ideia do que
terá sido a sociedade dos Tudor, levanta importantes questões sobre o ser
humano - o que andamos por aqui a fazer,
quem nos trouxe aqui, por que razões e com que fins…
Teria ele previsto que este tempo de «confinamento» nos haveria
de oferecer uma Terra mais limpa, mais
respirável, mais habitável?
MJC
janeiro 29, 2020
janeiro 15, 2020
o novo pai de Susana
quarta-feira, 19 de março de 2014
ao meu novo pai
As efemérides servem para nos lembrarmos de coisas importantes. Há quem argumente que são inúteis porque o Natal é todos os dias, o dia da Mulher também o devia ser, tal como o dia da Árvore e por aí fora. Mas não. Não é todos os dias que nos lembramos da luta pelos direitos das Mulheres, nem de sermos especialmente amigos do próximo, nem de plantar uma árvore. É por isso que estas datas até fazem sentido, para mim. E é por isso que faz todo o sentido celebrar o dia do Pai.
Comecei o dia a lembrar-me dos meus pais. Sim, tenho dois: um biológico, que esteve comigo até aos 9 anos, e um não-biológico, que me acompanhou daí para a frente. O meu pai biológico mudou-me as fraldas, aturou-me choros, acompanhou-me durante meses de internamento no hospital, quando tive de ser operada. Ensinou-me o que é ser criança, o que é o amor entre um casal (a sua versão disso), o que é importante num ser humano e aquilo que eu devia aspirar a ser. Ensinou-me as primeiras palavras, gravava a minha voz de bebé em K7 (a dizer "lula" em vez de "lua" por exemplo) enquanto apontava nos livros as coisas deste Mundo. Ele dizia e eu repetia. A lua, os mamíferos, os astros, os insectos. Com o meu pai biológico convenci-me de que queria ser veterinária, bióloga ou seguir uma carreira qualquer na área das ciências. Devo-lhe a vida, os olhos castanhos, o nariz empinado... e uma nuvem melancólica que me acompanha, e de que eu até gosto.
Depois surgiu o meu pai não-biológico. Inicialmente foi mal recebido, com gafanhotos na sopa e picos de roseira postos à socapa dentro dos sapatos. Mas depois começou a ensinar-me coisas. Ensinou-me o que é o verdadeiro amor entre um casal (e a sua versão disso é tão melhor do que a que eu conhecia). Ensinou-me História, Filosofia, Política, Arte, Ética. Ensinou-me, ó criatura de deus, a ter princípios, a manter a coluna vertebral direita e odepois a não deixar que me ponham a pata em cima. Ensinou-me aquilo que é importante num ser humano e aquilo a que eu podia aspirar a ser. De repente, resolvi ser jornalista.
Não gravou vídeos com a câmara de filmar, em que eu andava, macambúzia, às voltas num ringue de patinagem. Não gravou a minha voz num leitor de K7. Mas juntos palmilhámos as ruas de Dublin parecias um gafanhoto, tão magrinha que eras, os dois ainda quase desconhecidos, a tornarmo-nos amigos. E todas as fotos que me tirou foram sorridentes.
Ao meu pai não-biológico devo tudo o que tenho de bom. Pragmatismo, determinação, coragem. Foi uma presença firme, calma e positiva na minha vida. Por isso, neste dia e nesta altura em que se discute a coadopção e a importância da "família tradicional", é importante para mim dizer, ainda que seja num post altamente pessoal e lamechas, que a verdadeira família não é aquela que nos concebe - é a que nos acompanha e acarinha, seja do nosso sangue ou não. A maioria dos meus familiares são estranhos para mim. O meu novo pai não. Foi das melhores coisas que me aconteceu na vida. Conheço-o e ele conhece-me. E gostamos imenso um do outro.
S . Fernandes
outubro 25, 2019
A Solidão de Sermos Dois
"A Solidão de Sermos Dois"
E se, na busca do pai desconhecido, descobrirmos, com sobressalto, que o preferimos ausente?
Um romance contemporâneo que nos faz acompanhar uma família em busca da sua identidade. Uma história cravejada pelo trauma do abuso, a figura do predador, a sombra do incesto. Um périplo romanesco contemporâneo que nos transporta numa viagem com paragens tão dispares quanto Lisboa e Irlanda, África e Neve Shalom, algures entre Israel e a Palestina. Tudo cabe em A Solidão de Sermos Dois, uma obra da escritora lisboeta Maria João Carrilho, autora de livros como A Praça do Império, com a chancela da Guerra e Paz Editores.
Ninguém é completamente bom nem completamente mau: o lema da protagonista desta história. Eliza - Liza para os que ama – é uma jovem lisboeta que cresceu sem conhecer as suas verdadeiras origens. O romance ganha forma, quando Liza se depara com o desejo de querer encontrar o seu pai que nunca conheceu, à medida que vai enfrentando os agoiros que a afetam a si, a Laura, a sua mãe e a Flora, a sua tia.
Mas e se, na busca do pai desconhecido, descobrirmos, com sobressalto, que o preferimos ausente? Para descobrir apenas é preciso virar a página.
O que é certo é que A Solidão de Sermos Dois já está a despertar opiniões. Desde logo a do poeta António Carlos Cortez, que após a leitura desta obra afirma: «Ao estado geral da arte do romance em Portugal, Maria João Carrilho responde com um saber técnico da narrativa. Três vozes femininas contam, dos anos 60 à atualidade, um modo de viver o tempo, a memória e o amor, aceitando-se a lição do verso de Ruy Belo – na solidão acompanhada vivemos».
Mas o verso do poeta e ensaísta português não é caso órfão, a autora inspira-se ainda nas obras de David Mourão Ferreira, Amália Rodrigues e Carlos Tê. Referências basilares para o trabalho de Maria João Carrilho neste livro a não perder.
A Solidão de Sermos DoisMaria João Carrilho
Ficção / Romance
120 páginas · 15x23 · 13,00 €Nas livrarias a 2 de outubro
Guerra e Paz, Editores
Ficção / Romance
120 páginas · 15x23 · 13,00 €Nas livrarias a 2 de outubro
Guerra e Paz, Editores
julho 29, 2019
Os Valores e a Cristandade....
Sim, já muita gente deve ter lido Fátima Bonifácio...
Porque é um assunto de todas as épocas - os vários tipos de discriminação , cujas origens vão sempre dar ao MEDO.
Aqui fica parte do texto de M.S.T. , o rapaz bem educado.
« O texto dela é, aliás, eloquentemente exemplificativo disto: é um tratado intelectual de justificação do racismo branco e, o que é ainda pior, em nome dos “valores da Cristandade” e da ”civilização cristã”. Esses mesmos valores e essa mesma civilização que invocámos há quinhentos anos para justificar a escravatura. É absolutamente impensável que alguém se possa lembrar de recuperar tal justificação para se desculpar daquilo que não passa de um defeito de carácter. O racismo é um defeito de carácter e não há forma de o desculpar ou de o tolerar numa sociedade democrática e num Estado de direito. A lei não pode mudar o carácter das pessoas, mas pode e deve estabelecer as linhas vermelhas daquilo que é e não é tolerável na vida em sociedade. E esta é uma linha vermelha.»
Sophia diria - Esta Gente
Sophia diria - Esta Gente
março 27, 2019
Mensagem do Terceiro Mundo
Não tenhas medo de confessar que me sugaste o sangue
E esgravataste chagas no meu corpo
E me tiraste o mar do peixe e o sal do mar
E a água pura e a terra boa
E levantaste a cruz contra os meus deuses
E me calaste nas palavras que eu pensava.
Não tenhas medo de confessar que te inventaste mau
Nas torturas em milhões de mim
E que me davas só o chão que recusavas
E o fruto que te amargava
E o trabalho que não querias
E menos da metade do alfabeto.
Não tenhas medo de confessar o esforço
De silenciar os meus batuques
E de apagar as queimadas e as fogueiras
E desvendar os segredos e os mistérios
E destruir todos os meus jogos
E também os cantares dos meus avós.
Não tenhas medo, amigo, que te não odeio.
Foi essa a minha história e a tua história.
E eu sobrevivi
Para construir estradas e cidades a teu lado
E inventar fábricas e Ciência,
Que o mundo não pôde ser feito só por ti.
Fernando Sylvan ,1971- Ano internacional contra o racismo
E esgravataste chagas no meu corpo
E me tiraste o mar do peixe e o sal do mar
E a água pura e a terra boa
E levantaste a cruz contra os meus deuses
E me calaste nas palavras que eu pensava.
Não tenhas medo de confessar que te inventaste mau
Nas torturas em milhões de mim
E que me davas só o chão que recusavas
E o fruto que te amargava
E o trabalho que não querias
E menos da metade do alfabeto.
Não tenhas medo de confessar o esforço
De silenciar os meus batuques
E de apagar as queimadas e as fogueiras
E desvendar os segredos e os mistérios
E destruir todos os meus jogos
E também os cantares dos meus avós.
Não tenhas medo, amigo, que te não odeio.
Foi essa a minha história e a tua história.
E eu sobrevivi
Para construir estradas e cidades a teu lado
E inventar fábricas e Ciência,
Que o mundo não pôde ser feito só por ti.
Fernando Sylvan ,1971- Ano internacional contra o racismo
março 26, 2019
Aquela Bela Aldeia Minhota
Foi maravilhoso ter tido quinze anos e acordar muitas vezes naquela aldeia minhota.O cenário era o Monte de Sta Tecla e La Guardia; ouviam-se distintamente o repicar dos sinos na margem espanhola.
A capacidade de saber ver,depende principalmente, da idade, disposição e disponibilidade. Não sei pois, se era pela magia dessa idade, que eu podia acordar de um sonho real e mergulhar,noutro menos fugaz, que me permitisse apreciar sem mácula , a beleza das coisas. As manhãs eram quase sempre frescas, envoltas de uma leve bruma, ocultando em parte o solo verdejante. A pouco e pouco , o sol ia-se impondo e surgia a aldeia ridente em toda a sua plenitude;o rio que serpenteava as margens desde Valença, exercia,em tudo,um verdadeiro fascínio e descansava perto!No Largo de São Bento, as mulheres vendiam as solhas e robalos pescados no rio. De vez em quando, ouvia-se o silvo de um comboio, que - também ele - parecia não ter pressa de se afastar.
Pela tarde desses dias cálidos de Verão, o monte vizinho, emprestava ao rio, tonalidades diferentes.
À noite, da janela do meu quarto - aberta de par em par - viam-se as luzes das povoações espanholas circunvizinhas; a vila de Caminha e um ou outro barquinho que por lá vogava na faina da pesca.
De vez em quando, com os meus irmãos, fazíamos as nossas digressões pelos pinhais; embrenhavamo-nos, propositadamente,até ouvirmos o chiar de um ou outro carro de bois carregado de caruma. E era por ele que nos orientávamos no regresso a casa . Entretanto ouvíamos dos mais pequenos ,episódios fantásticos do seu mundo irreal!Eu escutava-os atentamente , não fosse o caso de , por qualquer forma irreflectida , quebrar o encanto.
Facilmente me irritava quando era contrariada, facto que era explorado de maneira incrível nas suas brincadeiras; por consequência , eu preferia pensar do que agir, não fosse ser alvo de provocação.
Conservo, ainda hoje ,de forma indelével, a recordação dessa época.Mais tarde, os matizes com que adornei a minha adolescência, foram substituídos por tons de cinza mais ou menos escuros. Remei contra a maré e habituei.me ás intempéries , cresci. Mas nada poderá esmorecer as saudades contidas , e só hoje expressas, nem a mágoa que sinto de jamais poder acordar , feliz, naquela bela aldeia minhota...
Conceição Mesquita
outubro 14, 2018
Manuel Castells,Carta abierta a los intelectuales del mundo
Manuel CastellsBrasil está en peligro, puede elegir presidente a un fascista, defensor de la dictadura militar, misógino, sexista, racista y xenófoboBrasil está en peligro. Y con Brasil el mundo. Porque después de la elección de Trump, de la toma del poder por un Gobierno neofascista en Italia y del ascenso del neonazismo en Europa, Brasil puede elegir presidente a un fascista, defensor de la dictadura militar, misógino, sexista, racista y xenófobo, que ha obtenido 46% en la primera vuelta de las elecciones presidenciales. Poco importa quién sea su oponente. Fernando Haddad, la única alternativa posible, es un académico respetable y moderado, candidato por el PT, un partido hoy desprestigiado por haber participado en la corrupción generalizada del sistema político brasileño. Pero la cuestión no es el PT, sino una presidencia de un Bolsonaro capaz de decir a una diputada, en público, que “no merece ser violada por él”. O que el problema con la dictadura no fue la tortura sino que no matara en lugar de torturar. En una situación así, ningún intelectual, ningún demócrata, ninguna persona responsable del mundo en que vivimos, podemos quedarnos indiferentes. Yo no represento a nadie más que a mí mismo. Ni apoyo a ningún partido. Simplemente, creo que es un caso de defensa de la humanidad, porque si Brasil, el país decisivo de América Latina, cae en manos de este deleznable y peligroso personaje, y de los poderes fácticos que los apoyan, los hermanos Koch entre otros, nos habremos precipitado aún más bajo en la desintegración del orden moral y social del planeta a la que estamos asistiendo.Por eso escribo a todos ustedes, a los que conozco y a los que me gustaría conocer. No para que suscriban esta carta como si fuera un manifiesto al dictado de políticos. Sino para pedirles que cada uno haga conocer públicamente y en términos personales su petición para una activa participación en la segunda vuelta de las elecciones presidenciales, el 28 de octubre, y nuestro apoyo a un voto contra Bolsonaro, argumentándolo según lo que cada uno piense, y difundiendo su carta por sus canales personales, redes sociales, medios de comunicación, contactos políticos, cualquier formato que difunda nuestra protesta contra la elección del fascismo en Brasil. Muchos de nosotros tenemos contactos en Brasil, o tenemos contactos que tienen contactos. Contactémoslos. Un mensaje por WhatsApp es suficiente, o una llamada telefónica personal. No nos hace falta un hashtag. Somos personas, miles, potencialmente hablando a millones, en el mundo y en Brasil Y porque a lo largo de nuestra vida hemos adquirido con nuestra lucha e integridad, una cierta autoridad moral, utilicémosla en este momento antes que sea demasiado tarde. Yo lo voy a hacer, lo estoy haciendo. Y simplemente ruego que cada una/uno haga lo que pueda.Manuel Castells es sociólogo.
outubro 07, 2018
julho 25, 2018
há dias em que o país me entristece
Se dou uma volta pelos «famosos» e de seguida pelos «admiradores»
dos famosos, a minha alma entristece.
Fama não é sinónimo de inteligência, muito menos de
sensibilidade, de entendimento do outro. Nada tem que ver com amor ao próximo
ou outras virtudes cristãs - entre aspas - , que tudo foi comercializado, rankingrizado.
- jesus cristo , não és culpado- deixa-te estar a
acenar por entre nuvens de um azul petróleo, de um céu poluído que nos mata, não,
cristo, cristo, não venhas cá abaixo ver
isto, dorme o sono dos justos e desiludidos da sorte.
junho 28, 2018
Novo romance
«Linda tarde, meu amigo, estou esperando o enterro de José Matias.»
Esta saudade da voz de David Mourão Ferreira no Anfiteatro I, foi por aí que me deixei levar, pela entoação queirosiana do Professor poeta.
E assim me foi sendo ditada a estória que inventei. Talvez por me ter deixado encantar por certo primórdio do ridículo, por tiques machistas em que ainda hoje se tropeça, não tenha resistido a outras vozes que, embora minhas , não me pertencem totalmente. Seriam mais de Eça contado por Mourão -Ferreira.
maio 16, 2018
Jorge de Sena
EM CRETA, COM O MINOTAURO
INascido em Portugal, de pais portugueses,
e pai de brasileiros no Brasil,
serei talvez norte-americano quando lá estiver.
Coleccionarei nacionalidades como camisas se despem,
se usam e se deitam fora, com todo o respeito
necessário à roupa que se veste e que prestou serviço.
Eu sou eu mesmo a minha pátria. A pátria
de que escrevo é a língua em que por acaso de gerações
nasci. E a do que faço e de que vivo é esta
raiva que tenho de pouca humanidade neste mundo
quando não acredito em outro, e só outro quereria que
este mesmo fosse. Mas, se um dia me esquecer de tudo,
espero envelhecer
tomando café em Creta
com o Minotauro,
sob o olhar de deuses sem vergonha.
II
O Minotauro compreender-me-á.
Tem cornos, como os sábios e os inimigos da vida.
É metade boi e metade homem, como todos os homens.
Violava e devorava virgens, como todas as bestas.
Filho de Pasifaë, foi irmão de um verso de Racine,
que Valéry, o cretino, achava um dos mais belos da “langue”.
Irmão também de Ariadne, embrulharam-no num novelo de que se lixou.
Teseu, o herói, e, como todos os gregos heróicos, um filho da puta,
riu-lhe no focinho respeitável.
O Minotauro compreender-me-á, tomará café comigo, enquanto
o sol serenamente desce sobre o mar, e as sombras,
cheias de ninfas e de efebos desempregados,
se cerrarão dulcíssimas nas chávenas,
como o açúcar que mexeremos com o dedo sujo
de investigar as origens da vida.
É aí que eu quero reencontrar-me de ter deixado
a vida pelo mundo em pedaços repartida, como dizia
aquele pobre diabo que o Minotauro não leu, porque,
como toda a gente, não sabe português.
Também eu não sei grego, segundo as mais seguras informações.
Conversaremos em volapuque, já
que nenhum de nós o sabe. O Minotauro
não falava grego, não era grego, viveu antes da Grécia,
de toda esta merda douta que nos cobre há séculos,
cagada pelos nossos escravos, ou por nós quando somos
os escravos de outros. Ao café,
diremos um ao outro as nossas mágoas.
IV
Com pátrias nos compram e nos vendem, à falta
de pátrias que se vendam suficientemente caras para haver vergonha
de não pertencer a elas. Nem eu, nem o Minotauro,
teremos nenhuma pátria. Apenas o café,
aromático e bem forte, não da Arábia ou do Brasil,
da Fedecam, ou de Angola, ou parte alguma. Mas café
contudo e que eu, com filial ternura,
verei escorrer-lhe do queixo de boi
até aos joelhos de homem que não sabe
de quem herdou, se do pai, se da mãe,
os cornos retorcidos que lhe ornam a
nobre fronte anterior a Atenas, e, quem sabe,
à Palestina, e outros lugares turísticos,
imensamente patrióticos.
Com pátrias nos compram e nos vendem, à falta
de pátrias que se vendam suficientemente caras para haver vergonha
de não pertencer a elas. Nem eu, nem o Minotauro,
teremos nenhuma pátria. Apenas o café,
aromático e bem forte, não da Arábia ou do Brasil,
da Fedecam, ou de Angola, ou parte alguma. Mas café
contudo e que eu, com filial ternura,
verei escorrer-lhe do queixo de boi
até aos joelhos de homem que não sabe
de quem herdou, se do pai, se da mãe,
os cornos retorcidos que lhe ornam a
nobre fronte anterior a Atenas, e, quem sabe,
à Palestina, e outros lugares turísticos,
imensamente patrióticos.
V
Em Creta, com o Minotauro,
sem versos e sem vida,
sem pátrias e sem espírito,
sem nada, nem ninguém,
que não o dedo sujo,
hei-de tomar em paz o meu café.
Em Creta, com o Minotauro,
sem versos e sem vida,
sem pátrias e sem espírito,
sem nada, nem ninguém,
que não o dedo sujo,
hei-de tomar em paz o meu café.
maio 04, 2018
vitória, vitória, acabou-se a história
Completamente,absurdamente só.
Deixei personagens e lugares,razões e desrazões para suicídio prematuro. Deixei-os no silencioso papel que se abre neste ecrã. E todos os dias lá volto, ao título ,às palavras,cuja janela fecho de seguida,já que me proíbo de lhes dar crédito.
- Não quero nada convosco, usurpadores de mulheres,tarados, reincidentes de paixões antigas. Matem-nos, afoguem-nos nesses mares de fonemas, lexemas e silêncios que tais! Que um fonema por si só não passa de um ímpeto de silêncio a quem roubaram sentido.
março 06, 2018
O dia em que não haverá dia da mulher
Aqui há uns anos teria sido a primeira a lançar-me à tarefa.
Dizer-vos coisas sobre o dia da mulher. Mas são tantos os dias para comemorar =
lembrar, não esquecer ...
O dia do homem sem pão, da criança sem casa, da viúva
de guerra, do doente sem cura, das
palavras não-ditas, dos panfletos não escritos, das bandeiras rasgadas, das
batalhas perdidas, da melancolia sem lágrimas.
fevereiro 13, 2018
dezembro 29, 2017
As bibliotecas de Helena
As Bibliotecas Municipais são uma porta aberta para a cidadania activa, palavras de Helena Abreu em Trinta Dias .
Alguns já terão dado conta do meu gosto por Bibliotecas. Largas horas devo ter passado na sala de leitura da Faculdade onde me deixavam vasculhar livros antigos , daqueles que não era permitido levar para casa. Muito mais cedo me tinha viciado em Bibliotecas - das itinerantes , como a dos jardins do Mouchão, durante as férias grandes em Tomar, às bibliotecas dos Liceus - em Oeiras, no Maria Amália ou no Liceu Salazar. Mas nenhuma delas me fez esquecer a do meu Bairro,em Sete Rios.
A moderna Biblioteca de Oeiras , bem mais confortável que a antiga -- onde levava a minha filha, ainda ela não sabia ler, a requisitar livros para as férias grandes -- é uma casa viva. Tudo ali pode acontecer.
A moderna Biblioteca de Oeiras , bem mais confortável que a antiga -- onde levava a minha filha, ainda ela não sabia ler, a requisitar livros para as férias grandes -- é uma casa viva. Tudo ali pode acontecer.
No Portugal «desfavelado» – Haja deus! Grande parte dos jovens, não terá memória dessa paisagem de bairros de lata que rodeavam Lisboa - do aeroporto, à cidade universitária e se estendiam pelos arredores –. Mas infelizmente que las hay, las hay ! Há quem precise de, como Carolina, no barraco sem água e sem luz, acordar de noite para ler e escrever à luz da vela.
Por isto e muito mais, as palavras de Helena Abreu valem. É que nem toda a gente consegue aliar a simplicidade à importância do assunto.
dezembro 06, 2017
Trumpalhices
Ao toque de saída corríamos que nem loucos pelos corredores,
atravessávamos os pátios até ao arvoredo que ainda hoje circunda o Liceu e ocupávamos
a árvore que nos pertencia. Deve ter
sido numa dessas fugas que ia abalroando a prof. de Ciências Naturais, a
avantajada senhora que percorria os corredores carregada de pastas.
Naquele tempo brincávamos às guerras. Eu escolhia ser índia. No meu cói, a árvore
mais alta junto ao gradeamento, guardava armas imaginárias – arcos e flechas
múltiplas além de penas para os cabelos. Estes símbolos de força da tribo protegiam-nos dos meliantes ,os cowboys.
Que lástima não ter conhecido Donald Trump nessa época – ele era bem capaz de ter sido meu inimigo,
de ter inventado pedras da calçada para desfazer as minhas penas, podia até ter
deixado marcas ensanguentadas no pescoço de alguns – mas a catarse do predador,
do guerreiro, trataria de o curar – para que o mundo amanhecesse em paz.
setembro 07, 2017
O Padre era nazi!
Mon
Peuple, de Abba Eban .
Un
Institut du Christianisme national socialiste fut chargé de démontrer que Jésus
n’était pas d’origine juive, pg 304 , cap. XX , O Holocausto. Abba Eban esclarece que «coube a um Instituto
do Cristianismo nacional socialista demonstrar que Jesus não era de origem
judaica». E prossegue – «Uma equipa de juristas, psicólogos e teólogos meteu
mãos à obra para libertar as tradições religiosas de qualquer traço de influência
judaica».
Cristo deve ter sido um tipo porreiro, uma boa pessoa. A
verdade é que não terá inspirado o senhor padre - cujo nome nem sei – que me fez o exame do primeiro catecismo e que
ficou muito zangado quando lhe respondi
que Jesus Cristo era judeu. Já nessa época gostava de ler coisas para além das
cartilhas. Lixei-me. Chorei durante dois dias – afinal não era a menina
inteligente que diziam. Nem sou. Essa foi apenas a primeira desilusão.
Não é que estou mesmo feliz? O que é que pode
fazer mais contente uma pessoa do que, muitas décadas vividas, verificar que
estava certa, ou que, pelo menos um ser pensante tinha chegado à mesma modesta opinião? Alguém que escolheu a sinceridade quando decidiu afastar-se da hipocrisia de uma
religião que veicula as verdades históricas que lhe dão jeito, que alardeia ser
a favor dos pobres conseguindo o milagre de se ter tornado mais rica do que toda a gente?
- Ai Cristo, Cristo, vem
cá abaixo ver isto! Assim se lamentava um amigo que já lá está, no Paraíso das suas cinzas, a
adubar qualquer pedacito de terra.
junho 16, 2017
Álvaro de Campos - meu secreto conselheiro
Arrumar
a vida, pôr prateleiras na vontade e na acção.
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado;
Mas que bom ter o propósito claro, firme só na clareza, de fazer qualquer coisa!
Vou fazer as malas para o Definitivo,
Organizar Álvaro de Campos,
E amanhã ficar na mesma coisa que antes de ontem — um antes de ontem que é sempre...
Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei.
Sorrio ao menos; sempre é alguma coisa o sorrir...
Produtos românticos, nós todos...
E se não fôssemos produtos românticos, se calhar não seríamos nada.
Assim se faz a literatura...
Santos Deuses, assim até se faz a vida!
Os outros também são românticos,
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres,
Os outros também levam a vida a olhar para as malas a arrumar,
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos,
Os outros também são eu.
Vendedeira da rua cantando o teu pregão como um hino inconsciente,
Rodinha dentada na relojoaria da economia política,
Mãe, presente ou futura, de mortos no descascar dos Impérios,
A tua voz chega-me como uma chamada a parte nenhuma, como o silêncio da vida...
Olho dos papéis que estou pensando em arrumar para a janela,
Por onde não vi a vendedeira que ouvi por ela,
E o meu sorriso, que ainda não acabara, inclui uma crítica metafisica.
Descri de todos os deuses diante de uma secretária por arrumar,
Fitei de frente todos os destinos pela distração de ouvir apregoando,
E o meu cansaço é um barco velho que apodrece na praia deserta,
E com esta imagem de qualquer outro poeta fecho a secretária e o poema...
Como um deus, não arrumei nem uma coisa nem outra...
Álvaro de Campos, in "Poemas"
Quero fazer isto agora, como sempre quis, com o mesmo resultado;
Mas que bom ter o propósito claro, firme só na clareza, de fazer qualquer coisa!
Vou fazer as malas para o Definitivo,
Organizar Álvaro de Campos,
E amanhã ficar na mesma coisa que antes de ontem — um antes de ontem que é sempre...
Sorrio do conhecimento antecipado da coisa-nenhuma que serei.
Sorrio ao menos; sempre é alguma coisa o sorrir...
Produtos românticos, nós todos...
E se não fôssemos produtos românticos, se calhar não seríamos nada.
Assim se faz a literatura...
Santos Deuses, assim até se faz a vida!
Os outros também são românticos,
Os outros também não realizam nada, e são ricos e pobres,
Os outros também levam a vida a olhar para as malas a arrumar,
Os outros também dormem ao lado dos papéis meio compostos,
Os outros também são eu.
Vendedeira da rua cantando o teu pregão como um hino inconsciente,
Rodinha dentada na relojoaria da economia política,
Mãe, presente ou futura, de mortos no descascar dos Impérios,
A tua voz chega-me como uma chamada a parte nenhuma, como o silêncio da vida...
Olho dos papéis que estou pensando em arrumar para a janela,
Por onde não vi a vendedeira que ouvi por ela,
E o meu sorriso, que ainda não acabara, inclui uma crítica metafisica.
Descri de todos os deuses diante de uma secretária por arrumar,
Fitei de frente todos os destinos pela distração de ouvir apregoando,
E o meu cansaço é um barco velho que apodrece na praia deserta,
E com esta imagem de qualquer outro poeta fecho a secretária e o poema...
Como um deus, não arrumei nem uma coisa nem outra...
Álvaro de Campos, in "Poemas"
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