junho 18, 2015

Muros , Maria Ângela Pires




Quantos mares, quantas separações, que diversas mortes terão perpassado pelas vidas de mulheres portuguesas. Quantas partidas , quantas chegadas . É esta a interrogação que está presente nestes Muros de Maria Ângela Pires.

Uma sensualidade velada, desta vez a saltar tantos muros , todos os que tivemos de abater naquele tempo escuro e proibido do amor.

Como Se Te Conhecesse
(…) mas no peito/ que no golpe se abriu// antes a boca/antes as mãos/ antes guardar-te/ sem que me doesse/  (pg37) .

Tanto E Tão Leve
 Tanto e tão leve/  o sabor/da pele/ travessia do corpo/ em mar amargo/ (pg 55).

Se algum traço comum nos assiste, a nós que somos da beira-mar, é a viagem. Ainda mais aos poetas. Da nossa terra vê-se o mar, da minha aldeia vê-se o mar, da minha janela vê-se o mar – e vamos , continuamos a ir e a querer voltar. Por isso somos cada vez mais do fado, a canção que MA tanto ouvia na infância. O tal destino e a nossa saudade.


Mas Maria Ângela  não esquece os muros deste presente  -  cada vez mais «muros». Há quem queira até mandar erguê-los para que se não misturem aqueles a quem a fome expulsa da própria terra ,  e os outros, os que possam vir a ser  infectados por algum sentimento de amor por essa gente.É que não cai bem que vejamos daqui,  do mundo cão, que somos também nós da mesma espécie, homens e mulheres – não  inimigos. 


Não resisto a deixar aqui grande parte de

 MARE NOSTRUM

Aos meus pés este desmaio/da água transparente/ (…)


(…) Que faço nesta hora se não posso encostar/sequer a porta  fugir/ ao desconforto fixo do olhar/ menos ainda segurar o leme/ignorar

as barcas os botes, as tábuas amarradas/ que balançam em gritos/contra os deuses sem glória/que lhes medem as forças/da vida por viver/batida em onda dura/ o sol sempre cravado na sua pele escura?

Deportados da sorte/atirados ao mar/quiseram não voltar/ e bateram no fundo// ( a luz é uma lâmina que cega/ e fecho os olhos)// E se eles tiverem/ toda a razão do mundo?!

(pg87,88) 



 O tal destino e a nossa saudade – ei-los que partem , os infantes, os filhos e filhas do século XXI- os que forem capazes de derrubar muros.




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