Muito antes de aprendermos a ler
já gostamos que nos contem histórias. Os avós, as mães, os pais e os tios. O mundo
fantástico da imaginação, dos ritmos das lengalengas que, ainda mal sabemos falar,
vamos macaqueando. Os sons amplificados ou segredados para diversas emoções, –
onde vais minha filhinha, pergunta o
lobo mau, quem não se lembra do arrepio, de tapar os olhos ao escutar as cenas
mais medonhas; de navalha fiz farinha,
contava o macaco do rabo cortado, o
medo, o riso, a ternura, a inveja e o ciúme, tudo nos é revelado nessas estórias
herdadas de bisavós, para avós e netos, tornados por sua vez os contadores dos
mesmos ritmos na actualidade.
Espero que sim, que não sejam apenas as
instituições e grupos de contadores de histórias a passar estas mensagens
longínquas que parecem fora do tempo, mas tenho dúvidas. A família tem percorrido diversos caminhos,
não se junta à volta da lareira. Muitas crianças, infelizmente, são habituadas
a estar permanentemente ligadas, primeiro à televisão, logo a seguir à net. E
absorvem como esponjas histórias bem diferentes das de “o macaco do rabo
cortado”; aos dez anos já vêm telenovelas de estética duvidosa, valores que
muito deixam a desejar.
Há dias falei com uma criatura que já escolheu a
profissão – ser famosa. Aos dez anos não sabe ler, apenas papagueia, junta
letras mas não lhes atribui significado. Não, não comecemos com o velho
discurso, no meu tempo não era assim, nesta
idade líamos os clássicos, Júlio Dinis, Garrett de capa amarela. Nem com o
dos pobrezinhos, que esta miúda convive com gente culta, ou pelo menos de
instrução acima da média.
Uma coisa é certa – contar uma história é sempre um acto de
amor, tem de ser.
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