A
única razão pela qual gostaria de viver para além da morte seria para aumentar
o que sei; o pouco que sei reside em dois arranha-céus ascendentes – um constantemente
supera o outro. Cada vez mais alto, o da ignorância.
E o
que mais gostava de saber , era sobre aqueles em quem pressinto qualquer coisa
de mim, que me iluminei deles pela epiderme do viver por onde andaram, pintaram
, escreveram, e hoje se me colam à pele sem eu saber porquê.
Miguel
Torga e Mário Eloy.
Torga que abominava “ a caserna e o espírito de casta”.
Torga,
que pelos vistos terá sido nascido e sofrido na pequenez de um Portugal pequenino.
Sim , este , o de Contos da Montanha, aquela humanidade tão simples.
Aos
dez anos despedido , mandado para o
Brasil, sempre insubmisso. “ Moleque de terreiro na Fazenda de Santa Cruz” retorna , aventura-se a
fazer o curso de medicina e consegue-o.
Torga não desiste de descobrir a vida, talvez
por uma insubmissão de índole, de se fidelizar a si próprio antes de a
quaisquer outras fidelidades.
Vai
lendo, pensando e escrevendo.Terá sido assim?
A literatura “
relevava do sagrado”. O artista ,“ o mais receptivo e perceptivo dos mortais”.
Ao artista – a alguns, que
agora passam fome e que escolhem ser
fiéis a si próprios – são confiadas mensagens dos deuses, quem sabe?
São
trabalhadores da arte todos os que recebem essas mensagens e as traduzem para
outros. Daí a mão que pinta ou a que escreve tantas vezes parecer ser levada
não pelo próprio, mas por outro. O artista interpreta enunciados que passam por algum filtro
inexplicável de imagens , de sons, de idéias, ou por um clarificador – isto soa um bocadinho
a detergente, cá está um exemplo de frase não-estética –. “Explodia, entretanto,
a dissidência latente entre os colaboradores e os directores da Presença, por “razões de
discordância estética e razões de liberdade humana”.
Como
eu gostava de ter estado com eles, ou de viajar a esse tempo.
Conhecer
o Mário Eloy, saber a história deste
desenho, desiludir-me por ele ser mortal, afinal.
Assistir
, mesmo caladinha no meu canto, aos argumentos a favor de uma certa
estética e de uma liberdade
humana. Que difícil, descobrir qual a liberdade certa e a estética adequada .
Ou vice-versa?
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