Eugénio Lisboa , Os clássicos são
um descanso.
Foi com grande júbilo que
deparei com estas palavras de Eugénio
Lisboa .
"O velho avô e o neto” ocupa apenas três quartos de uma página (e
mais uma “Nota” de página e meia). É curtíssimo, mas um forte teor de sabedoria
fecunda pode acolher-se em modesto espaço... A diarreia verbal quase nunca é o
melhor veículo."
No continho em questão, fala-se
de “um homem muito, muito velho que ficou com os olhos turvos e os ouvidos
surdos e os joelhos tremelicantes.” Dou a palavra aos Irmãos Grimm, para não
estar a fazer paráfrases desnecessárias:
“Quando estava sentado à mesa, mal conseguia segurar a colher e espalhava a sopa na toalha e deixava-a cair da boca. O filho e a nora tinham nojo dele e assim o velho avô acabou por ter de se sentar num canto atrás do fogão, e eles davam-lhe a comida numa tigelinha de barro e nem sequer a enchiam. E ele olhava tristemente para a mesa e vinham-lhe lágrimas aos olhos. Uma vez, as suas mãos tremelicantes não conseguiram segurar na tigelinha e ela caíu ao chão e partiu-se. A jovem mulher admoestou-o, mas ele não disse nada e apenas suspirou. Ela comprou-lhe então uma tigelinha de madeira por dois tostões e era dela que ele tinha que comer. Estando ali sentados, o pequeno neto começou a reunir uns pedacinhos de madeira do chão. «O que estás a fazer?», perguntou-lhe o pai. «Estou a fazer uma tigelita», respondeu o filho, «para dar de comer ao pai e à mãe quando for crescido». O homem e a mulher entreolharam-se por um momento e depois desataram a chorar.
“Quando estava sentado à mesa, mal conseguia segurar a colher e espalhava a sopa na toalha e deixava-a cair da boca. O filho e a nora tinham nojo dele e assim o velho avô acabou por ter de se sentar num canto atrás do fogão, e eles davam-lhe a comida numa tigelinha de barro e nem sequer a enchiam. E ele olhava tristemente para a mesa e vinham-lhe lágrimas aos olhos. Uma vez, as suas mãos tremelicantes não conseguiram segurar na tigelinha e ela caíu ao chão e partiu-se. A jovem mulher admoestou-o, mas ele não disse nada e apenas suspirou. Ela comprou-lhe então uma tigelinha de madeira por dois tostões e era dela que ele tinha que comer. Estando ali sentados, o pequeno neto começou a reunir uns pedacinhos de madeira do chão. «O que estás a fazer?», perguntou-lhe o pai. «Estou a fazer uma tigelita», respondeu o filho, «para dar de comer ao pai e à mãe quando for crescido». O homem e a mulher entreolharam-se por um momento e depois desataram a chorar.
Não existe unanimidade no que se refere à relação extensão / qualidade na obra de arte,
nem sequer quando falamos dos clássicos. Somos levados a crer que a super-estrutura
cultural vigente coloca os artistas não-alinhados numa espécie de limbo, censurados ora pela moral, ora pela religião , em suma, pelos diversos poderes. Aos poderosos
interessa manter esse mesmo poder – económico, cultural, estrutural. Se por acaso
ou mérito próprio algum passa da margem à fase seguinte e , abertas as portas
de todos os mercados assiste à aceitação
da sua produção artística , comete, não
raras vezes, o pecado de se auto-limitar e reproduzir o modelo esperado –
entrincheira-se numa elite confortável e madura , prestes a cair de podre"
. in, de rerum natura
De entre os outsiders, só muito
poucos ficarão na História, serão os clássicos de amanhã. Conheço alguns. Mas a
História é um lugar inóspito para se viver.
Quanto aos clássicos,
estão todos mortos, e vocês, os que hoje na margem brincam com as cores, as formas, jogam com as
palavras e os sons, dançam, actuam e performam, vocês estão vivinhos da silva.
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