Mais do que um dicionário, eu queria era aqui
o meu velho tio , a quem nunca perguntei se tinha tido revisores e como lidava
com eles. Imagino-os à mesa do café Gelo
ou do Império, ou talvez ali em Cascais, sem máquinas, sem computadores , a ir
de eléctrico até à rua das Pretas e a descer à Sociedade de Língua Portuguesa
. Até podia combinar um encontro ali, que o meu tio de certeza não se ia
importar- e como ele era gordo e preto, eu estava protegida, de certeza. Não ia
deixar que me atacassem com pontos de interrogação, com escolhas sem
explicações, que isto de falar para as máquinas é como ser cego, ouvir a voz, mas
não ver o gesto, não sentir o olhar, a faltar o movimento da mão, o modo de
sentar à secretária a pensar- que estopada, tenho de aturar esta.
Uma coisa já devo ter entendido:
um revisor não é uma pessoa qualquer,
como ouvia dizer em pequena. Imagino o poder que ele tem, o de riscar , o de
pegar no texto e esfaqueá-lo,numa frase, dissipar-lhe o sentido, e,
numa palavra , matar a música das que tocam com ela.
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