março 03, 2015

Lobo Antunes e as viúvas


Lá vou eu pôr-me a escrever parvoíces, não posso ler Lobo Antunes, tinha prometido a mim mesma não o voltar a ler tão cedo, mas a tentação é maior que o ladrão, desta vez a quase obrigação, que foi o Bruno quem mandou...



 Lobo Antunes está mais perto dos poetas -   O’Neill, José Gomes Ferreira,  o da mulher no eléctrico, pois. LA está mais perto das mulheres? Estará? Está pelo menos mais perto de si mesmo e de ter a coragem de o mostrar.

 A nós, escreventes femininas, já nos basta ter de saltar essa barreira da censura transformada em auto-censura, mais a barreira do mercado – o do livro, mais a barreira da moral, mais a da boa educação ,porra. Que uma senhora… há que ser virgem; uma mãe, virgem e pura …  Maldito o fascismo que nos deu cabo da vida, que nos deu cabo da verve, como dizia a avó , a fantasia, pois, maldita censura que ainda hoje se interpõe entre o que  nós queremos parecer e aquilo que  somos. 
Também nós tivemos a mesma guerra colonial, a nós deixaram sozinhas os maridos e os noivos, desperdiçando as nossas virgindades em esperas de vão de escada. De nós fizeram viúvas, algumas de fraco subsídio, a ter de trabalhar a dobrar , mas quase todas na fila do pão dos brandos costumes. 

Ah, como nós odiamos esta gente, a família militar e seus acólitos da igreja, como nós desprezamos as noites em que nos enganámos em sucessivas camas solitárias, como nós evitámos a palavra cio, enquanto vocês lá fora se rojavam no mato pela pátria, no tempo em que era connosco que se deviam ter deitado. E agora estão mortos. Mortos. Nem nos vale a pena chamar o vosso nome. Nada nem ninguém nos responde, a nós, às tais viúvas ou às sempre-noivas que ficaram.

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