Já que os jornais estão uma desgraça e que
esta fuga para junto dos poetas se começa a revelar obsessiva, decido-me por
uma evasão muito viajante. Trata-se do Diário
de Bordo de Ana Marecos - um diário em que a autora, a par de algumas
viagens ao seu próprio passado, compõe um balanço da sua vida profissional e
não só. Impressões de infância, os amores, a vida familiar.
Admiro as pessoas que se dedicam àquilo que
fazem profissionalmente, sobretudo aqueles a quem está reservado o papel de
“lidar com o público”, tarefa muitas vezes árdua que não se compadece de más
disposições ou confusões de vida que tanta vez atrapalham um bom desempenho.
Imagine-se a correria de uma
hospedeira de bordo, cuja obrigação é manter os passageiros felizes enquanto
pensa na família que terá deixado lá em casa. Uma vida alucinante. Mas AM não
perde o gosto por chegar e partir, isso não a cansa e tem ainda disposição para
ouvir e registar o português híbrido de D. Vilma:
«O mê
Toino deu-me um telefone destes que tem pernas e posso falar com ele sempre que
quero, mas nã gosto de disturbar» «O mê Toino Michael veio antes para arranjar
cá as coisas, ele trabalha nos traques, aqueles carros grandes que carrega as
marcadorias» «Quando ele era babe vínhamos a Portugal ver os avós, ele adorava
andar nos aviõs, lá em cima, cruz credo aquilo anda tã alto. Pedia-le juice pra
ele ficar quite.» «E no iróporti, assim que largávamos a exit punha-le a mão
nas ventas senõ ninguém le fazia um stop.»
Realismo linguístico?
No final, um tom de despedida-
que é sempre uma espécie de morte - «o último voo, nem sempre dizemos hasta luego». Embora «o grande truque da
vida seja nunca dizermos Adeus».
Primeiro estranha-se, depois
entranha-se, é o que dizem – este hábito de andar de um lado para o outro, de
querer pisar toda a terra.
Para quem gosta deste tipo de
viagens, um boa fonte de inspiração, este Diário de Bordo.
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