abril 21, 2012

salazar , o medo


um namorado, um pai, um irmão, um amigo na guerra, não havia quem não tivesse. o maior medo era o da morte. voltarem estropiados do corpo ou da alma, não nos ocorria assim tanto. medo de comprar certos autores, certos títulos, ou de os vender, o livreiro olhava-nos nos olhos, venda, que eu não digo nada a ninguém, mas ele ficava-se por ali, medo de que fossemos da pide, não temos, não. medo de publicar o que escrevíamos, podiam não gostar de nós, pior ainda, cortar, cortar, cortar, silenciar o pensamento. medo de ir ao médico, podíamos estar grávidas e ter que decidir abortar em segredo. medo de falar, que as meninas decentes não existiam para ter ideias, medo que o nosso pai fosse preso, uma vergonha, que o nosso irmão desertasse ou se perdesse pelos montes cheios de neve antes de chegar à fronteira. medo de ouvir conversas, quanto menos soubéssemos melhor. medo de quem entrava na nossa casa, à despedida podiam puxar de um cartão-de-visita, se precisar de alguma coisa, por baixo do nome, a sigla, pide- dgs, como se não fosse nada.

no limite do medo, quando a mordaça ameaçou matar-nos e nós decidimos viver, dando a própria vida  caso fosse preciso, muita gente se juntou, para que nunca mais houvesse medo.


5 comentários:

  1. Comovente e verdadeiro!Era assim, ainda me lembro do dia em que me passaram sorrateiramente panfletos subversivos e eu os li rápidamente no WC do café onde parava.Saí da casa de banho e alguém cravou os olhos em mim, como se soubesse o meu pensamento.Era o tal que diáriamente abancava na mesa do canto, sózinho, calado, observando entre muitos cigarros a malta.Sempre o julgámos da PIDE, afinal não era, vim a saber mais tarde! Passaram-se semanas antes que libertasse da ideia o medo de ser preso.

    O país era uma prisão, as cabeças os carcereiros, o medo de ser ouvido, espiado, perseguido, preso, submetia-nos.Contudo, havia os resistentes, os que tinham medo mas não se submetiam.Como o Luís da livraria Ler, em Campo de Ourique, numa das esquinas do jardim da Parada, que guardava escondidos os livros proscritos pela censura, que ele considerava importantes para a formação politica e humana da malta.Depois eram-nos vendidos a prestações, pagávamos conforme íamos recebendo as mesadas.Apesar da PIDE lhe vandalizar a livraria, das apreensões de material e autos sem conta, nunca o conseguiram dobrar, ao Luís.

    Este povo que teve esperança com o fim da ditadura, presentemente tão mal tratado, teve os seus "heróis", e há-de continuar a tê-los, make no mistake about it. Só é preciso é que a tampa da panela salte, que os mais esclarecidos se oponham como então, e se revoltem contra a reedição de medos anteriores.

    ResponderEliminar
  2. ou de os vender, o livreiro
    olhava-nos nos olhos e via ou não se eramos daqueles que eram capazes de dar o triplo ou o quádruplo por um livro apreendido e que a Pide e outros actores das oficinas de cortes de papel disponibilizava em lotes de 30 ou 40 aos alfarrabistas da praça

    os livrinhos do vilhena atão...

    e os mytos creados
    o livro não se vendia
    e o livreiro dizia é dos últimos foi apreendido

    até dizem que um editor lisboeta pagava para lhe apreenderem uns avos da obra

    quanto ao medo existia como inda existe

    ResponderEliminar
  3. se bem me lembro e tou eskecido21 de maio de 2012 às 15:06

    a capitania de évora até ao porto nã era assi tanta
    e só os spinolistas eram mais de 2/3
    e os milicianos por razões óbvias ficaram fora

    sargentos recém promovidos a tenentes em 60 e tal e capitães em 74 só havia 5 ou 6

    logo tanta gente adeviam ser menos de duzentos e poucos

    muita gente pra derrubar um regime
    com os magalas a irem servir de tiro ao alvo em lisboa em vez de seguirem para áfrica...

    em 5 de outubro havia muito mais...

    depois do dobre de finados é que se juntou muita gente
    mas o regime já tinha caído horas antes
    sem um paiva couceiro que o segurasse

    ResponderEliminar
  4. caro se bem se lembra e está esquecido:

    Se bem se lembra " nunca tão poucos"
    foram os que derrubaram o regime, é a sua versão dos acontecimentos e tem todo o direito.

    Não tenho números,provavelmente esses poucos valiam por muitos mais, conheci alguns, antes do dia seguinte.

    ResponderEliminar
  5. caro excessivo

    Claro que os livreiros poderiam fazer essas fitas de que fala.

    O seu excesso pode levá-lo a considerar o medo de ontem igual ao de hoje.

    POR ENQUANTO ainda não, por isso devemos falar dele.

    ResponderEliminar