fevereiro 07, 2013

Brad Leithauser , leitor à força



Diz-me lá o que é que pensas disto. Um pedido compreensível entre amigos e familiares de autores que no meio de páginas solitárias vão despejando as suas histórias.


 É isto que Brad Leithauser desenvolve num artigo bem-humorado da New Yorker.

Quando alguém se decide escrever começa por se convencer de que encontrou finalmente uma forma de expressão criativa, excitante e individual. Só que de individual tem muito pouco.


Imagino eu que um autor possa estar sempre rodeado de imensa gente. Dorme e acorda com as personagens que chegam a impedi-lo de dar este ou aquele rumo à sua história. Em lugares públicos, se por exemplo se passeia à beira-mar, não consegue resistir a observar as pessoas, os outros, que virão a enriquecer, mal sabem eles, determinada personagem – a escolha de uma ou outra atitude, a descrição de lugares que ela  terá visitado, ou por onde andará num futuro do tempo da narrativa. Para além desta gente de brincar, existem as pessoas a sério, aquelas que o autor começa a imaginar que são bem capazes de vir a ler a história que ele inventa.


O leitor está sempre presente? Não existe mensagem sem receptor? Sem receptor fora do autor da mensagem? Há quem diga que não, a vida não ser um solilóquio, nunca nada nesta vida existir sem o seu reflexo –  l’autre, era assim que o nomeávamos no tempo em que a filosofia em francês estava na moda.



Essa a razão pela qual, segundo Brad Leithauser, aquele  que escreve um romance  acaba por pertencer a uma rede.

 Por vezes uma intrincada teia de múltiplas variáveis a que todos são aconselhados a não resistir.


 Se não fores tu, com quem é que posso contar para uma opinião avisada e sincera. Tu, meu aluno na faculdade, com quem já tantas impressões sobre literatura, tantas obras foram trocadas, tu que já leste tanto, que até estás ligado ao mundo da escrita por uma ou várias razões – o teu pai é um escritor conhecido, a tua tia trabalha numa editora, a filha é professora de escrita criativa, o neto é jornalista


E a desgraçada vítima acaba por aceder Ok, venha lá esse livro. The deeper the friendship the harder you may find it. E quando uma vozinha interior lhe segreda ao ouvido – e se eu detestar o que ele escreveu, é demasiado tarde.

 É mesmo divertida a forma como Brad Leithauser descreve as diversas reacções  deste leitor- cobaia.


Aqui em casa já sacrifiquei algumas pessoas a leituras e opiniões sobre o que escrevi. 


Desde que a minha filha me confessou o incómodo de ler certas passagens em que a autora se afastava da mãe, provavelmente a sua santa mãe, inodora e incolor, como as idealizamos em criança, faço os possíveis por a poupar a isso. Concluí que as opiniões mais isentas são as de "os nem muito longe nem muito perto", ou dos "quanto mais longe melhor”; por exemplo, um técnico de tomografia, desapaixonadamente longe de nós, cuja verdade pode ajudar, quer estejamos doentes, ou não.



Até porque, no caso de o diagnóstico não ser favorável, podes sempre recorrer a conselhos de outros técnicos, como os de  Brad Leithauser.

* (adaptação e tradução livre em  itálico).


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