Personagens que fingem não ser ficção e outras que
não assumem abertamente o facto de não passarem disso mesmo, deixando
o leitor sempre na dúvida. Quem goste de ler vivendo com intensidade todos estes papéis,
acaba por correr o risco de perder o norte. Tudo pode ser e não ser, e
para isso já basta a vida.
Confesso
ter investido demasiado tempo a clarificar todas as ligações de Artur. Artur,
filho de Beatriz, neto de Lurdes e José, e de Herculano, pai de Fernando,
casado com Arménia. Oti, Gabriela, Vítor, Ivo, Judite, ciclo de amigos de que
Joana, a desaparecida, faz parte. E senti-me Lurdes, a mulher que perde a
memória. Mas a leitora preguiçosa ultrapassou esta primeira rejeição.
Ufff! Terminei. Saí do murakami, das aventuras dos
cinco, dos deuses do Olimpo , das trapaças dos policiais, das caixinhas
infindáveis de suspeitas e documentos forjados que também podem não o ser, dos
irmãos Coen, de filmes em que não estive. Incursões associativas tipo janelas
do Windows,sempre mais uma para abrir, com
vista para outra e outra- o what if
até às últimas , infinitas consequências.
O mais apelativo – as notas de pé de página que explicam o ponto de vista
do autor, da mulher do autor, do editor, de sandokan e bakunine, do gajo da
Papua-Nova Guiné. Sabe-te bem entrar no jogo do autor – Bruno Margo a piscar-nos o olho , tu sabes que eu sei que tu sabes, e o
leitor, por seu lado, com a verdade me
enganas .
Uma interpretação realista do
pensamento? Sinto-me mais descansada, todos somos esquizofrénicos. Ou um
retrato fantasista do real?
Tanta inovação é verdade? Não, admite o autor, (Bruno Margo) e aceito, a verdade não interessa nada, É mais um artifício desta comédia de
enganos.
O jogo pode ser interessante? Muito,
mas daqueles jogos que se vão aprendendo a jogar.
E nem todos somos
jogadores.
E
não é que , abrindo as janelas que tenho
por costume abrir, uma após outra , na ilusão de poder abarcar todas as
opiniões e possibilidades de interpretação seja do que for,tropeço em guerras de alecrim e manjerona entre o conto e o romance ,
polémicas que acabam por confirmar a ideia de que ambos os géneros , sendo
diferentes têm direito à vida – o romance, obcecado por incluir nele o mundo
inteiro, correndo o risco de falhar, ao lado do conto que consegue ver um mundo num grão de areia, to see a world in a grain of sand , bela citação de Blake.
Pelo
sim pelo não encontramo-nos por aqui um dia destes para um café, para trocarmos umas palavrinhas sobre o assunto.
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