setembro 21, 2014

Livros como cerejas – O Chamador





  Gosto de partir virgem para um autor, não saber nada ou quase nada sobre ele, nem onde nasceu, onde estudou, se foi casado ou solteiro. Ainda menos se terá votado neste ou naquele partido.  Para voltar a sentir a febre que senti com Faulkner, a primeira vez, Faulkner literalmente febre. Infectada por esta doença incurável , este vírus que só acalma ,não quando o livro se acaba, mas quando se pega no lápis ou na caneta e se transfere para um rascunho mal amanhado a impressão sobre o que se leu, ou seja, o que a gente leu, com os nossos olhos apenas, nós e o livro que lemos.  A partir desse momento vamos ter uma conversa frente a frente com o autor, esse desconhecido, esse labirinto que teremos percorrido com deleite, de luminosos dias, de feridas abertas ou equimoses, as várias vidas a que ele nos terá transportado, ou não. Antes e depois de Faulkner, quantas florestas não teremos desvirginado.  Pois uma delas, Laborinho Lúcio, no início do Verão, que entretanto esqueci mas que tive de relembrar – o tal rascunho mal amanhado –  para a sessão do grupo de leitores da Biblioteca de Oeiras. Vá lá, o que eu tinha entendido  não estava assim muito longe do que  outros leram.   Suspiro de alívio   –  Uff! A qualidade do discurso, o registo poético, as metáforas, as ternuras, as loucuras. E o fio narrativo? Ser ou não ser um romance, eis a questão. A alguns isso não incomoda por aí além, mas é tentador discutir, porque lhe chamam romance, podia ser um livro de memórias, uma série de contos ou crónicas , impressões. Mas há um fio condutor? Será o teatro? O encenador?


As dúvidas não acabam e há logo quem acrescente pormenores sobre a vida do autor, estudos em Coimbra ...


   Esta obra de Laborinho Lúcio é referida como « ficções». E é disso que se trata . As discussões a que nós voltamos sempre – sobre a forma, são importantes sim.  O romance já não é o que era ,não , nem se mede pelo número de páginas, não , como se ouve às vezes dizer ( até no meio de gente muito sabichona ou sabedora) – size counts?

Aqui mesmo à minha frente, está um livro desses que dão febre- Camus. E muito perto, outro, de Joseph Conrad, O Coração das Trevas, 126 páginas. Mais acima Virginia Woolf, Joyce, discurso interior, mergulho introspectivo ou simples jogo da memória, prolepses e analepses .  Isto é ou não é literatura?

Estamos na mesma? Recorre-se ao curriculum profissional do autor, terá sido Ministro- o gossip habitual  – estou a ser injusta,  – não só, os leitores procuram explicações, na cabeça de um tinhoso, como se diz em Campo de Ourique.


Vejam o que Yudith Rosenbaum, também apaixonada por o que se lê e como se lê, cita  ( Clarice Lispector)





e Alberto Pimenta, ( Hayman)






Na casa dos segredos das tertúlias da arte, inovar sai caro, muitas vezes se ouve  – A bolsa ou a vida?


Saímos muito depois da hora. É por isto que eu gosto do meu grupo de leitores, meu não, do Bruno.

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