junho 17, 2014

Lídia Jorge, Os Memoráveis, Aragon , «...ah pitié, ah pitié de celui qui n’a pas d’avenir!»



A pergunta que se impõe a quem lê o romance de Lídia Jorge que apresenta a revolução de abril e «Os Memoráveis» – Esta democracia, o ópio do povo?


 Memoráveis que não quiseram ser heróis nem aproveitar-se e tomar as rédeas do poder que acharam por bem conceder ao povo, ingenuamente se apagando para dar lugar aos outros. Os que os sanearam em Novembro, os que prepararam a vingança servida fria, em pratos de cinismos e salamaleques, de corrupções mascaradas de solidariedades fictícias ,de liberdadezinhas, de logros. – Que bom que é ter tantos cartões de crédito, diziam, iludindo o povo adormecido que poucos quiseram acordado.


Os brandos costumes deram-nos um fascismo assim-assim, um colonialismo porreiro, esta democracia , o  ópio do povo. Agora o povo unido esgota-se num mero voto, e sim, será vencido, este será sempre vencido, se, ao contrário dos que originalmente cantavam esta cantiga, se deixar ficar no sofá , a criticar, a mandar bocas no tasco, com muitos copos de três à frente ou jolas pelo bairro alto. A democracia não se esgota no voto, o povo unido só não teria sido vencido se a revolução fosse o dia-a-dia, se molemente não nos tivéssemos deixado arrastar para o bem-bom do  eles-que-façam.


Ingratos, consentimos  pensões aos Pides para que comodomamente pudessem continuar a conspirar na sombra favorecendo o poder do bruto e não do que esclarece, educa, critica. Mas nunca agradecemos aos que não quiseram ser heróis, nem ao Charlie 8 nem aos 5000,como nos conta Lídia Jorge. Alguns deles já mortos, outros saneados, injuriados e presos injustamente por quem não tem um milionésimo da dignidade deles, não arriscou um cagasésimo da própria vida no 25 de Abril. Os relvistas do séc. 21 que começaram a ovular, no próprio dia 26 de 74. Esta é a  democracia de centuriões, homens agarotados que amuam e  recusam ouvir o povo.  


 Nesta obra que agarra o leitor pela alegoria e que cavalga ,página a página,  para a  parábola, cita Lídia Jorge o verso de Aragon cantado por Jean Ferrat  La femme est l’avenir de l’homme.  

Que não fôssemos «alforrecas», clamava a senhora dona Teresa que queria fazer de nós« umas mulherzinhas » nas aulas de moral no liceu salazarento dos brandos costumes e não me consta que fosse nem comunista, nem anarquista…


  «...ah pitié, ah pitié de celui qui n’a pas d’avenir!», cito eu que não sei cantar.

Obrigada  Lídia Jorge, por perseguires o «coração da história» ( the heart of the matter?),  o indizível; alguma semente de verdade germinará do terreno fantasioso, quase fantástico, deste realismo .



Nota:
Para aqueles que nasceram depois de nós, da geração que conduz a trama desta narrativa e que não domina o francês como a bilingue  Machadinha ,aqui fica o link para  -  Le Fou d’Elsa de  Aragon .

2 comentários:

  1. A propósito das palavras de Aragon cantadas por Jean Ferrat "La femme est l´ávenir de l'homme" tive na quarta-feira uma experiência muito interessante. Estive na sessão que se realizou no Tivoli de apoio a António Costa para Secretário-Geral do PS e futuro primeiro ministro. Numa sala apinhada de gente era evidente que as mulheres estavam em maioria. Parece que estamos mesmo a caminho da sociedade matriarcal de que os demógrafos começam a falar!






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    1. Resistem, sobretudo se põem em causa a sobrevivência da espécie....

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