março 12, 2013

Tiago Patrício, Trás- os - Montes






Assim como há quem diga que quando se morre não se vai logo para a morte, ponho-me para aqui a imaginar quais terão sido os sítios por onde andámos antes de sabermos que existíamos.

Só a partir do momento em que nos lembramos dela é que podemos dizer quando começa a nossa infância. Aquilo que não recordamos não existe. Por isso é tão significativo o que a nossa memória retém desse período – a surpresa, a verdade dos sentidos, a liberdade do olhar.

Pareceu-me que este romance tinha que ver com estas sensações. Lembro-me de uma impressão semelhante me ter ficado de uma outra história, que como esta, resolvi partilhar com gente de quem gostava – Panait Istrati, Os Cardos de Baragan, que redescubro num esforço googlíco de memória.

Ora, ao ler Trás- os-Montes, é essa sensação que me prende, a mesma de quando li Panait Istrati, num tempo em que nem sabia onde ficava a Roménia. De ambos me ficam as infâncias de sítios fechados, lugares que ninguém conhece, lugares que imagino no meio de montes e por detrás de muros que se abrem para mundos brilhantes, por caminhos de infâncias à beira da terra, de segredos que se escondem dentro dela e nos ensinam a viver.

 A crueldade infantil, a caça aos pássaros, a vergonha do corpo da mãe de Teodoro, as regras estritas de costumes em que os irmãos controlam as irmãs, o seu bom nome. As missas, as raparigas mais velhas com os cestos de ofertório em roupas de cabaré, o pecado, as revistas com mulheres, tenho de pecar, tenho de pecar senão rebento, diz Edgar.

Trás-os-Montes, um livro aonde apetece voltar, como a todas as infâncias.


Sem comentários:

Enviar um comentário