maio 19, 2012

capote , juan marsé e a cadeira


Era uma vez uma menina que só tinha duas histórias para ler – o sapo e a princesa e hansel e gretel – a menina lia e relia os livros que cabiam na palma da sua mão. Lia para ela, para os irmãos, para os amigos, de cada vez descobrindo uma nova entoação demonstrativa do desgosto do sapo e do amor da princesa que acreditou no impossível, a bondade num sapo. Em hansel e gretel seduziam -na os caminhos difíceis, o truque das pedrinhas e o risco de se perder qualquer menina.

Na contracapa de cada pequena história, lá estava a lista de outras histórias que ela gostaria de ler, mesmo por baixo do símbolo de uma joaninha. joaninha –avoa – avoa que o teu pai está em Lisboa.

Esperou, esperou, que se lembrassem de lhe trazer mais histórias, tinha sido ensinada a não pedir nada. Se me perguntassem era esta que eu escolhia – as três maçãzinhas de ouro – mas ninguém perguntou.

 Uma manhã, dessas manhãs tipo férias da Páscoa, em que a monotonia invadia todas as salas e quartos, sem se poder brincar na rua, costurar, muito menos jogar, para não pecar, pôs-se a matutar sobre o assunto. E se bem pensou, melhor o fez – pegou num lápis muito bem afiado e escreveu, escreveu, com aquela caligrafia difícil que só ela entendia. 

Chamou os irmãos e disse – Já temos mais uma história, as três maçãzinhas de oiro – Onde é que arranjaste? 

Como não tinha, inventei.


Nem sei o que é que isto tem que ver com a entrevista que encontrei em o bibliotecário de babel, as palavras de Truman Capote lembradas por Juan Marsé.


 O escritor, quando nasce, recebe de Deus uma flor, mas também um chicote. A literatura é trabalho, é esforço. E o leitor não tem de se aperceber desse esforço. Escrever é como fazer uma cadeira. Quem compra a cadeira não tem de saber o que sofreu, ao fazê-la, o homem que construiu a cadeira. 


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