O livro, a capa, o cheiro a cola, determo-nos num parágrafo, virar a folha, voltar atrás, escrevinhar a margem, sublinhar uma passagem, inscrever o nome de uma personagem no círculo que inventamos para elas, nos códigos que só nós entendemos, tudo isso a par do sorriso ou de um coração apertado, da nostalgia de muitos passados, de alguma lágrima que a emoção descontrola. Tudo isto é possível quando se lê digital.
O mesmo Eça das velhas lombadas vermelhas gravadas a ouro da colecção Lusitânea, de O Mandarim ou o José Maria. De capas verdes a imitar as antigas, do Círculo de Leitores, ao cartonado alaranjado menos clássico da Tragédia da Rua das Flores que povoam algumas estantes.
Esse, o mesmíssimo com quem andei por estes dias por cadeiras alongadas, encostada às almofadas da cama antes de dormir, ou aqui neste meu cantinho, o desejado quarto que seja meu, por este tempo cada vez mais meu de que finalmente usufruo, uso e abuso, às vezes com o remorso de abandonar família, amigos e algumas paisagens que amo.
Eu e o netbook, como o beijo profundo e terrível em que deixei a alma, entre saliva e gosto a pimentão (pg.106) ou pensando em deixar o mundo rolar não esperando dele senão um rumor de harmonia que a embale e lhe favoreça o dormir dentro da mão de Deus (pág. 243), reencontramos Eça de Queirós. A conhecida ironia e um olhar complacente de quem já viveu quase tudo de A Cidade e as Serras – a mesmice, eis o horror das cidades, não podia estar mais de acordo consigo, caro Príncipe!
Como peixe na água, ler digital, um sucedâneo muito aceitável de um livro a sério. Nunca é tarde para abandonar um preconceito.
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