janeiro 23, 2012

se calhar devíamos deixar de perder o nosso tempo a alimentar este clima de intriga e pegar o boi pelos nomes

 Sonhei que era a  Maria Mendes  , lá  para os lados de   Paderne, que nos idos de novecentos, eu, a Maria Mendes , me teria perdido de amores por um algarvio ,  e que a esse chamamento da carne e da alma a que os mais românticos chamariam paixão e os menos pecadores, os  de sotaina,  devassidão, libertinagem, podridão.

Mas  eu era a Maria Mendes e tinha já uns olhos transparentes e uma blusa florida além de umas pernas quentes sob a saia rodeada. Via-me numa noite de baile mandado a ser bem ou mal, mandada, pois, e a consentir. E a ir , numa relationship, num tempo sem facebook- antes-pelo-contrário-  nesse tempo ou tinhas sido enganada e eras uma concubina, ou não o tendo sido o eras na mesma. E tu a criares a Mariazinha o melhor que sabias , a tratar-lhe das febres e das varicelas, mas a seres não mais que a madrasta, aquela com quem o pai dos filhos se deita no pecado. E a não poderes comungar na missa, que vives amancebada e em pecado mortal.

 E nos idos de novecentos e tais, a Mariazinha já criada,   que ao tempo não seria mais que a namorada  do senhor doutor, que era o que eram as discretas obedientes noivas dos senhores doutores . A Maria coitada, a querer fundar uma próspera família, a desejar dar aos filhos o que ela não tinha tido, a haver de subir na vida. A Maria, o arrimo do seu homem, por quem tudo sacrificaria, a bem da nação, a bem da família. E o senhor doutor , coitado, a ter de assinar uns papéis para os senhores da nato, como muitos de nós tiveram de fazer , afirmar ser fiéis à pátria em papéis azuis em troca de um lugar, se  o nosso nome não tivesse ainda sido inscrito em dossiers da António Maria Cardoso.

E vai o Senhor doutor, com tantas recomendações da sua Maria, que não falasse da outra a tal Mendes , a ser mais papista que o papa, a acrescentar uma notazinha de pé de página, pois claro, não fosse o diabo tecê-las.

  E eu no meu sonho, a querer chamar os bois pelos nomes , aqueles que já na escola primária apontavam  à  professora – foi aquela menina , minha senhora, foi ela.

 
 Vozes da criançada,  filhos, netos e sobrinhos me invadiram a casa . Gritavam em espanhol, vá-se lá saber por quê,  liberdade ou morte !

 
E então acordei.

1 comentário:

  1. Ainda bem que acordou!
    É que se o sonho se prolongasse,de certeza que iria acabar numa enorme tragédia,e de tragédias já bastam as da vida!

    Acordado

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