setembro 27, 2011

ohran pamuk


Esta é uma obra que se lê, do princípio ao fim, com um sorriso. A Gioconda estaria provavelmente a ler Ohran Pamuk e A Cidadela Branca quando o Leonardo lhe tirou a tal fotografia.


   O leitor é conduzido para este jogo de ilusionismo em que enredos se descobrem dentro de outros,desde o prefácio, atribuído ao “ historiador” Faruk Darvinoglu ( uma personagem de um romance anterior de Pamuk).

   Tudo acontece aparentemente por acaso – Viajávamos de Veneza para Nápoles quando os navios Turcos nos entravaram o caminho. É pois ao império Otomano que vamos ser transportados. Neste cenário se encontra o Mestre com o estrangeiro, Ele e o Outro, duas identidades se vão confundir, estabelecendo uma simbiose total. O Sultão fez-me revelações que me assombraram” –   “ eu já nem sabia bem a qual de nós diziam respeito. O escravo inventa para sobreviver – pg 76 –  “… para manter acordado o seu interesse a meu respeito “, como Sherazade.

Ao longo da narrativa o autor, ou o (os) seu(s) alter-ego, segreda - nos ao ouvido. Insinua doses de intimidade cada vez maiores. O leitor, cúmplice; quase uma personagem? Também a nós Sherazade quer seduzir. Perto do final da história comenta – os mais inteligentes de vós já terão abandonado este livro e, um pouco antes sugere - se tiverem paciência para continuar a ler.
  É o momento de nos apresentar o visitante, Eveliya, que poderia ser um leitor como nós, um observador, cujas opiniões podem divergir da nossa, ou da de Ele (o Mestre/o escravo) ou do próprio autor. Ao visitante afigura-se não sei se apenas vergonhoso ou até mesmo promíscuo, este excesso que o “Mestre” projecta nos tempos futuros, de nos comprazermos a analisar as nossas gavetas do cérebro, tudo o que somos, este exagero de termos o nosso ponto de vista é, para o visitante, nojento. Provavelmente pensará ele que tanto narcisismo é capaz de ser de mais. Evelya não aceita que se esteja sempre a procurar “ o estranho em nós mesmos, arriscávamo-nos a tornar-nos outra pessoa, também nós e os nossos leitores igualmente, Deus nos livre!”
Contudo o autor compraz -se a mergulhar nessas nunca límpidas águas. Confessa não se poder fugir a isso, como na cena  em que ambos, Ele e o Outro se eternizam na mútua observação doentia da imagem deles no espelho. Quem somos nós? A pergunta mais aliciante do mundo. Lembro-me agora que, pela boca do Sultão o texto chega a sugerir que seremos provavelmente todos muito iguais. Conhecendo o espírito provocador do Sultão, sente-se o estrangeiro estarrecido


Que seria de nós sem a nossa identidade? Será esse medo que nos tem afastado tanto de sermos, mais iguais? Que não vos aconteça, como a um doente da pag. 147,ficarem acorrentados, é que “como muitos doidos, imaginara que era outra pessoa”. Quem tem medo de ser Ele e o Outro?

1 comentário:

  1. Muito bem escrito!Ainda bem que não somos mais iguais,seria monótono.
    "Quem somos nós?",aliciante?
    Não...é inquietante!


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