janeiro 26, 2015

o tempo é inexorável




Ontem fui ver um filme de guerra. Não gosto de filmes de guerra. Os filmes de guerra fazem-me lembrar as guerras em que não entrei a matar mas em que me morreram amigos, desses que não voltam mais.

No átrio do cinema encontrei um – bem vivo – mas que não via há dez anos ou mais. Olá, então como vai, canta o Chico. Cenas de passeios com «a quadrilha» era assim que o grupo se auto- denominava, no tempo em que éramos capazes de fazer a pé Paço de Arcos- Carcavelos ida e volta, os quatro ou os cinco, na conversa, na risota. 

Tudo o que é ou foi o nosso mundo, incluindo «os amigos», está presente nos livros que se escrevem. Perguntar a quem vive se o que faz é autobiográfico, como se pergunta às vezes a quem escreve, a quem pinta, não faz lá muito sentido – Não creio que um autor se separe completamente de si próprio quando pinta, escreve ou faz filmes. Nem mesmo quando encarna uma personagem.

Tudo o que se inventa passa pelo que passa por nós. 

Por vezes é só uma frase que ouvimos a alguém – com ela se constrói uma estória inteira, se fabrica, se inventa, ou reinventa.

  O “Paulinho” passa por um capítulo de outra ficção que deverá sair um destes dias. É uma cena de mar – num navio ao largo de uma ilha equatorial alguém visita esta personagem. Ou seja, o meu amigo está lá, sem ser completamente ele, mas está. Será que ele sabe? Ou vai saber?

Lembro-me de um outro com quem passei uma época que não se esquece e que me dizia muita vez – frase que me ficou para sempre – o tempo é inexorável. Quer queira, quer não, a verdade é que este amigo está presente neste romance. Será que ele alguma vez o vai ler e se vai reconhecer?

 Ao voltar a casa tento descobrir o que foi feito dele, na Net, claro. A esse encontrei, o da história do rapaz que se benzia sempre que passava à porta da Catedral. Mas não a vai ler, de certeza. – Tinhas razão, a morte é inexorável.

Há quem diga que se escreve para se ser lembrado, eu acho que escrevo para não esquecer.



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