Estive há uns
meses na Biblioteca Nacional para assistir ao lançamento da 5ª edição do
livro de filosofia politica – A CONFIANÇA NO MUNDO, SOBRE A TORTURA EM
DEMOCRACIA - que José Sócrates escreveu e que nesta edição especial
contem uma excelente capa de Júlio Pomar e um profundo postfácio do pensador
Eduardo Lourenço.
Antes do início
da sessão passei pela livraria da Biblioteca onde encontrei um interessante
opúsculo de Miguel Unamuno com o título: OS PORTUGUESES, UM POVO SUICIDA.
Talvez mais interessante e ajustada ao momento que vivemos é uma carta de
Manuel Laranjeira que Unamuno reproduz na íntegra. Não vou deter-me sobre
a biografia de Manuel Laranjeira. Quem estiver interessado em conhecê-la
encontrará no Google bastante informação sobre este médico pensador (1877/1912)
que teve uma activa vida política e intelectual e que acabou suicidando-se
também.
Limitar-me-ei
a transcrever a carta que Miguel Laranjeira dirigiu a Unamuno que a ela se
refere dizendo o seguinte:
“Lede agora uma
carta que um dos meus amigos portugueses - Miguel Laranjeira - me escreveu há
um mês. Refere-se ela à minha notícia de que penso publicar um livro sobre
Portugal. Aqui a deixo sem nada suprimir:
Amigo, não
imagina o prazer que senti ao saber que V., espírito superior, andava a compor
um livro sobre as coisas da minha terra, desta minha tão desgraçada terra de
Portugal.
Desgraçada! É a
palavra.
O pessimismo
suicida de Antero de Quental, de Soares dos Reis, de Camilo, mesmo do próprio
Alexandre Herculano (que se suicidou pelo isolamento como os monges) não são
flores negras e artificiais de decadentismo literário. Essas estranhas figuras
de trágica desesperação irrompem espontaneamente, como árvores envenenadas, do
seio da Terra Portuguesa. São nossas, são portuguesas, pagaram por todos.
Expiaram a desgraça de todos nós. Dir-se-ia que foi toda uma raça que se
suicidou.
Em Portugal
chegou-se a este princípio de filosofia desesperada: o suicídio é um recurso
nobre, é uma espécie de redenção moral. Neste malfadado país, tudo o que é
nobre, suicida-se; tudo o que é canalha, triunfa!
Chegámos a
isto, amigo. Eis a nossa desgraça. Desgraça de todos nós, porque a sentimos
pesar sobre nós, sobre o nosso espírito, sobre a nossa alma desolada e triste,
como uma atmosfera de pesadelo, depressiva e má. O nosso mal é uma espécie de
cansaço moral, de tédio moral, o cansaço e o tédio de todos os que se fartaram
de crer!
Crer?! Em
Portugal a única crença ainda digna de respeito é a crença na morte
libertadora. É horrível mas é assim!
A Europa
despreza-nos, a Europa civilizada ignora-nos, a Europa medíocre, burguesa,
prática e egoísta, detesta-nos como se detesta gente sem vergonha,
sobretudo…sem dinheiro. Apesar disso, em Portugal ainda há muita nobreza moral,
ainda há pelo menos nobreza moral para morrer e ainda existem coisas bem dignas
de simpatia.
O seu livro
há-de reabilitar-nos um pouco, seguramente V. , que é homem de paixão e
sentimento e vê as coisas da vida através da lógica afectiva, há de ser naturalmente levado a
defender calorosamente um povo essencialmente sentimental.
Quando penso
que sobre nós pesa a herança trágica, secular duma ignorância podre e duma
corrupção criminosa, o meu espírito enegrece e sinto-me possuído de um pavor
indizível, talvez absurdo. E, mais que saber se vamos para a vida ou para a
morte, me preocupa saber se morreremos nobre ou miseravelmente!
Aniper
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